Excomungado por defender LGBT, Padre Beto é nosso novo colunista

Religioso é referência na defesa de uma religiosidade inclusiva e aberta

Publicado em 01/07/2015
Padre Beto, que defende o casamento gay pela Igreja Católica, foi excomungado em Bauru (SP), em 2013
Padre Beto foi excomungado 'sem direito de defesa' há dois anos

Um paradoxo marcou o ano de 2013 no que diz respeito a LGBT e a religião. Ao mesmo tempo que a Igreja Católica ganhava a liderança de um Papa que faria história ao defender maior acolhimento de LGBT, a mesma instituição, no Brasil, excomungava um padre por justamente ele pregar mais compreensão das sexualidade e diversidade humanas.

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Padre Beto, de Bauru (SP), foi notícia ao ser expulso da Igreja Católica acusado de cometer heresia e ferir dogmas da religião por declarar-se contrário a moral sexual vigente. A tentativa de cercear a expansão de sua mensagem, entretanto, não foi bem sucedida. 

Referência hoje no Brasil de religioso que concilia a fé com uma visão ampla da sexualidade, padre Beto - nascido Roberto Francisco Daniel - realiza cerimônias, missas alternativas e batismos, faz palestras e celebra casamentos de casais heterossexuais, homossexuais e dentre divorciados.

E, com muita honra, padre Beto passa a ser colunista da Guiya Editora em nossos quatro sites (São Paulo, Floripa, BH e Salvador). É um reforço ao trabalho inédito no Brasil feito por nós, de divulgar lista atualizada de igrejas inclusivas e todos seus eventos. 

A entrevista abaixo é o início dessa soma em nome da religiosidade em seu sentido mais fundamental e humano. 

Como começou sua defesa de que LGBT podem ser aceitos pela Igreja Católica?
Eu sou padre desde 1998. Já nos meus primeiros anos venho me confrontando com a realidade dos LGBT principalmente por meio das confissões. Muitos homossexuais religiosos me procuraram, durante estes anos de sacerdócio, para expor as suas angústias e medos em relação a sua sexualidade e a moral imposta pela Igreja Católica.

Sempre foi para mim incompreensível a posição da Igreja em relação à sexualidade e à homossexualidade. Nunca consegui compreender a razão da sexualidade humana estar, de alguma forma, relacionada ao pecado (afastamento de Deus) e sempre foi para mim injusto impor aos homossexuais a castidade. Afinal, a Igreja Católica sempre teve a postura hipócrita e ignorante: “nós aceitamos os homossexuais (o pecador), mas não a homossexualidade (o pecado)”. Graças a esta incompreensão sempre, desde os meus primeiros anos de sacerdócio, venho questionando a necessidade de uma mudança de mentalidade e de postura da Igreja Católica. Pois sua moral sexual além de não ter fundamento bíblico, causa mais mal do que bem.

Padre Beto foi excomungado em 2013, em Bauru (SP), por defender o casamento gay na Igreja Católica
Religioso dá palestra e, mesmo fora da igreja, celebra casamentos, inclusive homossexuais

Como o senhor se sentiu quando começou o processo de excomungação? Você acreditava que isso poderia acontecer?
Foi tudo muito rápido. Não houve exatamente um processo. Quando eu percebi, já estava em um tribunal de inquisição sem direito de defesa. Tudo me pareceu muito surreal. Afinal, não havia cometido crime algum, apenas procurei expor, de forma clara, um conflito existente entre a moral sexual da Igreja e a realidade dos LGBT e como este conflito é totalmente desnecessário e ridículo em pleno século 21. Por isso, não conseguia acreditar que eu estava sendo excomungado.

Até hoje, somente 400 padres foram excomungados por pedofilia. Ora, pedofilia é crime, e nós sabemos que os casos oficiais superam ao numero de 400 em todo o mundo. Outro dado interessante é que o ultimo padre excomungado por questões humanitárias fora Giordano Bruno em 1600! Realmente eu não acreditava no que estava me acontecendo.

Há possibilidade desse processo ser revertido?
Sim, se eu pedir perdão. Mas seria ridículo pedir perdão por afirmar que o uso da camisinha e dos anticoncepcionais não é pecado, que a homossexualidade como a heterossexualidade e a bissexualidade são sexualidades que podem ser vividas de forma sadia e não são pecados, ou seja, não vão contra a Deus.

Seria ridículo pedir perdão por afirmar que duas pessoas que se amam, sejam elas do mesmo sexo ou não, são abençoadas por Deus. Eu poderia pedir perdão e voltar para Igreja Católica, mas este perdão seria falso da minha parte e representaria um retrocesso em relação à sociedade que desejamos ter, ou seja, uma sociedade que respeite a diversidade sexual, que possa viver em liberdade e que cultive o verdadeiro amor ao próximo.

O senhor convivia com outras pessoas na Igreja que tinham a mesma opinião sobre os LGBT e a Igreja?
Convivia sim. Mas o assunto sexualidade e diversidade sexual apesar de estar definido pela moral sexual católica sempre foi um tabu nos ambientes católicos. Muitos padres são gays, por exemplo, mas procuram não discutir sua sexualidade, e apesar de concordarem com tudo o que afirmo, continuam, por medo, a repetir o que é imposto pela instituição, ou seja, continuam a colocar uma cruz nas costas dos homossexuais e a cultivar, portanto, a homofobia nos lares e ambientes católicos.


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