Marcio Claesen
O salva-vidas Donato (Wagner Moura) fica abalado por não conseguir salvar um turista estrangeiro. Acaba se relacionando com o amigo do morto, o motoqueiro Konrad (Clemens Schick), e troca Fortaleza por Berlim para acompanhar seu amor. Deixa o irmão, Airton (Jesuíta Barbosa), para trás, que mais tarde vai cobrá-lo a fuga.
A premissa de Praia do Futuro, nova produção de Karim Aïnouz (dos prestigiados Madame Satã, 2002, e O Céu de Suely, 2006), é boa, e, de certa forma, funciona no longa que estreia nesta quinta-feira, 15, no circuito brasileiro.
Pode parecer, à certa altura, que o filme não tem conflito, mas ele tem e são três: um para cada capítulo do longa. Isso é o que mais o prejudica, pois deixa uma sensação de fragmentação e de estar assistindo a episódios de uma série.
O salva-vidas de Moura também não é um personagem tão simples para cairmos de amores. Ele pouco fala e parece, na maior parte do tempo, não ter certeza do que está fazendo. Assim como nós, na vida real. Somos incoerentes, trancamos nosso demônios, mas exigimos clareza do outro.
Como o próprio ator explicou na coletiva do filme, realizada em São Paulo, seu personagem se expressa muito mais pelo que faz do que pelo que fala. E Wagner, falando ou não, continua excelente. Tente não pedir mais do que Donato conseguiria entender que o personagem fluirá melhor pelos acontecimentos da história.
Avesso às trilhas sonoras em seus longas, Karim Aïnouz quebrou sua tradição em "Praia". Ele diz que música é assim, ou toca no espectador ou não. Não deu certo aqui. Mas uma ressalva: a trilha incidental não surge em todo o filme e as poucas canções cantadas aparecem em cenas bem específicas que, estas sim, ajudam a contar a história.
Se Jesuíta Barbosa estava bem como o soldado gay Fininha em Tatuagem, de Hilton Lacerda, aqui ele rende uma interpretação ainda melhor. Airton, irmão esquecido do salva-vidas, surge na última parte do filme para um acerto de contas. O ator está seguro e encara um embate - literal - com o irmão, que deixa perceber boas escolhas de Karim: saem discursos melodramáticos que outros diretores usariam aqui. Entram força e vigor como molas propulsoras de sentimentos reprimidos.
A mesma visceralidade também surge nas cenas de amor e sexo entre Donato e Konrad. Ambos os atores contaram que os dois meses de ensaio para o filme os ajudaram a criar intimidade e que fazer uma cena desse tipo com um homem não difere em nada de uma cena com uma mulher.
E se falamos de Konrad, não dá para não notar o colírio que é Clemens Schick. O loiro tatuado vai ficando cada vez mais gato durante as passagens de tempo do longa. E - acredite - pessoalmente ele consegue ser ainda mais bonito.
Entre erros e acertos, o longa fala de escolhas - difíceis, inexplicáveis - que tomamos durante a vida e conta um romance gay que, se por um lado não levanta bandeiras, por outro, soube ser fiel aos seus personagens, com as particularidades de uma relação homem x homem. Um casamento gay é como qualquer outro romance. E ao mesmo tempo não é.
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