Crise econômica ou falta de conhecimento pode levar algumas marcas identificadas ou feitas para gays quererem ampliar o segmento consumidor. Entretanto, o que pode aumentar aí é o risco de morte da empresa. Esse é o vaticínio do professor de Ciências Sociais do Consumo na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) Fábio Mariano.
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"A crise potencializa e pede a segmentação. Não o contrário. Aí é que se deve aprofundar no refinamento e na sofisticação do relacionamento da marca com o segmento, no caso, o gay", diz Mariano, que também é diretor da empresa InSearch - Tendências e Estudos de Mercado.
Nessa entrevista, ainda sobre fortalecimento das marcas voltadas a homossexuais, há o alerta sobre a importância de as companhias abraçarem causas sociais, e a constatação de que a estética gay tem se tornado cada vez mais determinante no mercado em geral.
Antes de chegarmos ao mercado gay, falemos de segmentação. Como fazê-la de forma correta atualmente?
Foi-se a época de segmentação por faixa etária, por gênero, por classe social. Hoje ela deve ser orientada pela atitude do consumidor. É aí que estão um conjunto de valores que incluem características que vão do tipo de comida à prática social e aos valores, por exemplo.
Veja um esportista. Ele gosta de determinados alimentos, pratica exercício físico, valoriza áreas verdes... A segmentação atual tem a ver com isso!
Qual a consequência disso para a empresa e seus responsáveis?
Deve-se estudar cada vez mais o ser humano! Para melhor atender determinado consumidor, é preciso entendê-lo mais e mais. Está posto o desafio!
Momentos de crise econômica ou falta de conhecimento de marketing por parte de uma empresa voltada a gays pode levá-la a querer ampliar o público atendido. Qual o risco embutido aí?
Primeiro que crise deve levar não à procura de novos segmentos a serem atendidos. Não deve ser essa a primeira atitude. É o contrário! A crise potencializa e pede a segmentação! Aí é que se deve aprofundar no refinamento e na sofisticação do relacionamento da marca com o segmento, no caso, o gay.
Querer falar com todos, mudar a comunicação de uma hora para outra, é suicídio! Sabe a razão? Uma marca, tal como uma pessoa, tem uma biografia, tem uma história, uma trajetória. Querer mudar isso simplesmente tem tudo para levar a uma situação catastrófica, que é a de ser vista como traidora tanto pelos gays - no caso, o segmento conquistado - quanto pelos novos consumidores do outro segmento potencial - héteros em geral, por exemplo.
A Dove, por exemplo, prega a beleza natural. Como ela pode, de repente, querer falar de botox? Vê como isso faz desmoronar a imagem já construída e não empreende nada de sólido no lugar? Perder a identidade, isso para uma marca, é fatal.
É como uma festa ou uma grife gay querer, do dia para a noite, atrair héteros em geral!
Sim! Mesma coisa! Quem se identificava com a marca deixa de ter essa relação e quem estava começando a ser prospectado pela empresa descobre a história da companhia e vê que aquela imagem não é a que ele deseja. E estamos em época de redes sociais! Isso tudo acontece de forma muito fácil!
E aí, um ponto: não quer dizer que uma marca voltada a homossexuais não possa atrair héteros. Pode sim, mas os héteros, vamos classificar, mais abertos, menos preconceituosos. Repito, a questão é de atitude. A marca foca na atitude e quem a tiver vai se identificar com a empresa e pode consumi-la.
Então um flyer de uma festa gay, por exemplo, que mostra homens desnudos, não deve de repente mostrar um casal hétero!
A questão da publicidade voltada para gays está carregada da estética gay. É sexy. É moderna, ligada à música, ao entretenimento. E veja que interessante: essa estética já foi assimilada pelos trend setters, pelos up to daters. Está na estética mais geral! Qual a razão de deixá-la de lado se até quem não é gay está aderindo a ela? De novo, a resposta é atitudinal!
Que outro passo importante uma marca dedicada a gays deve seguir?
O século atual é da defesa de causas. A empresa deve abraçar uma bandeira social que tenha forte relação, no caso, com o público homossexual. A marca deve olhar para seu segmento, identificar causas importantes a ele e trabalhar por ela. Esse fator é base para o sucesso neste século.