O desafio não é novo, mas ele mostra estar com fôlego renovado. Em 2009, Cássio Rodrigo encerrava quase quatro anos na cadeira de gestor do órgão de políticas LGBT da Prefeitura de São Paulo. Agora, 11 anos após e iniciado o segundo mandato do prefeito Bruno Covas (PSDB), é dele de novo o cargo.
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Nesse ínterim, ele reforçou seu nome como gestor para o segmento. Destaque ao período de abril de 2016 a fevereiro de 2019, quando foi coordenador no governo estadual.
Nesse caminho arco-íris, agora Cássio encontra um cenário cinza. A pandemia do novo coronavírus, como ele delineia nessa entrevista ao Guia Gay São Paulo, fragilizou socialmente a população LGBT, que enfrenta inclusive fome, e até áreas de convivência e empresas para o segmento.
Dentre as soluções apontadas está o compromisso de atender lésbicas, gays e bissexuais cisgêneros nas ações sociais da prefeitura que tiveram sucesso junto a transgêneros.
"Deveremos pensar em forma de inclusão social e no mercado de trabalho ou em algum meio de transferência de renda para todos indivíduos do coletivo."
Como você se sentiu ao ser convidado para retornar à Coordenação de Políticas LGBTI da prefeitura?
Foi uma grande surpresa! Não esperava! Mas me senti muito honrado pelo reconhecimento a todo o trabalho desenvolvido ao longo das últimas duas décadas junto à administração pública e nas políticas para a população LGBTI+.
Também me senti honrado com a oportunidade de atuar junto à secretária [Municipal de Direitos Humanos e Cidadania] Cláudia Carletto e ao prefeito Bruno Covas, que sempre foi grande apoiador das políticas LGBTI+ quando esteve em outros cargos, tais como deputado estadual e federal.
Como você avalia o trabalho da Coordenação desde sua saída, em 2009, até hoje?
Quanto estive à frente da Coordenação ela havia acabado de ser criada. Era um desafio pensar em políticas públicas para a população LGBTI+. Não havia exemplos. Não havia uma coordenação nacional. Hoje o cenário é totalmente diferente. Aprendemos muito e consolidamos muitas políticas.
Claro que o preconceito e a discriminação ainda são grandes na nossa sociedade machista e heteronormativa, então ainda temos grandes desafios a vencer para a plena cidadania da nossa população.
A Coordenação tem orçamento próprio ou é apenas um órgão de articulação? Como você avalia essa situação?
A Coordenação é um órgão de articulação da política municipal voltada para os direitos da população LGBTI+. Sempre foi. Isso não quer dizer que ela não tenha ou não deva ter orçamento.
A Coordenação Municipal de Políticas LGBTI+ possui orçamento aprovado, inclusive porque há necessidade tanto de continuar algumas políticas, tais como os cinco centros de cidadania LGBTI+, as quatro unidades móveis e o Programa Transcidadania, que são gastos fixos da coordenação; quanto para criar projetos.
São Paulo tem vários serviços e políticas exclusivas para trans, tais como abrigo, bolsa de emprego, capacitação profissional e feira de vagas para trabalho. Você pretende fazer políticas similares para pessoas LGB cisgêneros?
Na minha gestão, em 2008, criamos o Projeto Piloto de Geração de Renda e Inclusão Social numa parceria entre as secretarias municipais do Trabalho, a de Assistência e Desenvolvimento Social e a de Participação e Parceria. Era o Programa Operação Trabalho LGBT – POT LGBT.
O programa tinha por objetivos elevação de escolaridade, profissionalização, capacitação para o mercado de trabalho, geração de renda, inclusão social e cidadania. Com ele atendíamos a toda a população.
Num dado momento, a coordenação entendeu que o segmento mais vulnerável da população LGBTI+ eram travestis, mulheres transexuais e homens trans por ter menor acesso à educação e ao mercado formal de trabalho, o que é a mais absoluta verdade. E por isso foi criado o Transcidadania.
Acredito que, hoje, em tempos de pandemia, quando estamos vendo toda nossa população LGBTI+ sofrer com a falta de emprego e demais oportunidades, deveremos pensar em forma de inclusão social e no mercado de trabalho ou em algum meio de transferência de renda para todos indivíduos do coletivo.
Quais são suas principais metas como coordenador?
Metas são muitas, mas acho que o principal desafio é como garantir a saúde física e mental da população LGBTI+ nesse momento de pandemia, quando casos de discriminação e violência dentro do ambiente familiar ocorrem e são recorrentes.
Também penso em como atuar, durante a pandemia e rumo ao término da mesma, para garantir a empregabilidade e sustentabilidade da população LGBTI+. Sabemos que o covid-19 causou grande impacto social no segmento principalmente na questão do mercado formal de trabalho.
Outra meta é a retomada do Conselho Municipal de Políticas LGBT, pois, enquanto órgão que agrega representantes da sociedade civil, poderá auxiliar muito na construção dessas políticas.
Como a coordenação tem agido para ajudar, durante a pandemia, pessoas e empreendimentos LGBT?
Temos ajudado pessoas durante este período. Mantemos centros de cidadania LGBTI+ abertos para atendimento psicológico, social e jurídico, além de estarmos, por meio do programa Cidade Solidária, distribuindo cestas básicas para pessoas LGBTI+ em vulnerabilidade e cadastradas junto aos centros de cidadania e ao CRD.
Também temos estimulado os empreendimentos LGBTI+ que atuam na área de gastronomia a se inscreverem no Projeto Rede Cozinha Cidadã.
Essa iniciativa da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania tem como objetivo garantir a segurança alimentar da população em situação de rua durante a pandemia ao mesmo tempo que ajuda a retomada de restaurantes que se encontram fechados. Eles fornecem as refeições.
Por fim, estamos indicando para as boates o Edital de Premiação e Apoio à Casas Noturnas e Espaços Culturais de pequeno e médio porte, cujas inscrições estão abertas até 3 de maio.
Trata-se de iniciativa da Secretaria Municipal da Cultura que pretende beneficiar 200 casas e espaços da cidade. Tudo é feito tendo a cultura como principal agente de tranformação social.
A região do Largo do Arouche, Vieira de Carvalho e Praça da República, que é área arco-íris mais antiga da cidade, sofre com muitas questões, tais como segurança e limpeza. A coordenação pretende fazer algo a respeito?
Estamos num momento em que não é recomendado nenhum tipo de aglomeração, mas temos sim, como meta, repensar a ocupação da região, inclusive com mais segurança para nossa população.
Lembro que, em 2011/2012 tínhamos projeto em parceria com o Estado, no qual o Esquadrão das Drags comparecia todo final de semana para reforçar o uso cidadão do espaço público.
Como consequência, a própria comunidade que frequentava o espaço, cuidava da área, evitava jogar lixo fora das lixeiras. Havia várias secretarias envolvidas. Com o fim da pandemia, pensamos em retomar a ação.