'Mãe Só Há Uma', de Anna Muylaert, é sublime drama sobre trans

Filme baseia-se em história real do adolescente Pedrinho, sequestrado na década de 1980 dentro da maternidade

Publicado em 17/07/2016
Mãe Só Há Uma, de Anna Muylaert, apresenta drama de Pierre, sequestrado na maternidade e descobrindo sua identidade trans
Naomi Nero protagoniza delicado longa de Anna Muylaert

Por Marcio Claesen

Dois temas bastante sensíveis se justapõem no novo longa de Anna Muylaert, Mãe Só Há Uma, que chega aos cinemas da capital na próxima quinta-feira 21.

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A diretora, que vem do bem-sucedido Que Horas Ela Volta? (2015), no qual discutia desigualdades sociais brasileiras, agora baseia-se em uma história real, com grande repercussão na mídia: a do menino Pedrinho, sequestrado em uma maternidade de Brasília em 1986 e encontrado pela mãe biológica em 2002.

No drama de Anna, o adolescente roubado se chama Pierre (Naomi Nero) e além de enfrentar a verdade dolorida de uma nova família que ele não pediu para conhecer, tem de lidar com a descoberta de uma nova identidade de gênero.

Questões complexas demais que transformariam uma trama como essa em um show de situações-limite, embates, gritos e trilha sonora exagerada nas mãos de muitos, aqui caminham suavemente com uma direção competente e que faz escolhas acertadas. 

Uma delas é no elenco. A opção ousada de colocar Dani Nefussi para interpretar as duas mães (Aracy, a falsa, e Glória, a verdadeira) de Pierre/Felipe só poderia ter sido feita por alguém, como Anna, com muito tato para extrair, de atores que possuem muitos recursos, nuances e detalhes sofisticados. Obviamente, à atriz também lhe cabe parte do mérito.

Matheus Nachtergaele, o nome mais conhecido do elenco, imprime dor e frustração no pai (também Matheus no filme) com tendências homofóbicas, e que sofre no momento em que mais deveria sorrir, o de encontrar o filho roubado 17 anos atrás.

Entre o experimento de um batom com o banheiro trancado e uma saída com amigos vestindo calcinha por baixo do jeans, Pierre vivencia o que seu íntimo lhe pede. Nesta fase de descobertas, ser confrontado pela cobranças de novos pais, só o faz aderir ainda mais à atitude típica de um adolescente, o enfrentamento. As rusgas são inevitáveis e Nero conduz bem o personagem, com o bônus de sua deliciosa beleza andrógina.

A diretora abre portas generosas para as discussões e o longa passa tão rápido que desperta o desejo de uma continuação para sabermos mais do caminho de Pierre, o ampararmos nos momentos de dores e dividirmos suas conquistas.


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