Nos últimos anos, tem sido cada vez mais fácil viver a sexualidade de uma forma simples e verdadeira, mas, mesmo com todas as mudanças da sociedade diante de questões LGBT, a dificuldade de assumir a sexualidade e identidade de gênero ainda é real.
Assumir-se LGBT é uma questão interna que pode ou não fazer parte de seus planos. Muitas pessoas chegam em meu consultório com esse conflito e, na maioria das vezes, só é um conflito porque existe o medo da rejeição, do abandono, da falta de afeto e entendimento dos familiares.
Com a coluna Psicodiversidade, que estreia aqui no Guia Gay São Paulo, quero propor reflexões e um novo olhar diante de questões LGBT. No texto de hoje, vou falar sobre as reações que alguns pais têm quando uma ou um jovem assume sua sexualidade ou identidade de gênero.
É comum que, desde a descoberta da gravidez, todos pais carreguem expectativas. Alguns sonham em ter netos, outros querem filhos médicos e a idealização de cada um toma conta de suas vontades. Porém, quando ocorre o contrário daquilo que eles planejaram para seus filhos, algo se destrói, é como se aquele filho já não pudesse contribuir com todos os sonhos e esperanças projetados.
Em um primeiro momento, é comum que pais e mães não consigam lidar bem com a informação e tenham comportamentos inesperados ou distorcidos. Veja:
Culpa: pais costumam se sentir culpados. No consultório, presencio perguntas como: O que eu fiz pra isso ter acontecido? Será que foi a forma como eduquei? E é essa culpa que mais impacta a relação;
Vergonha: muitos pais sentem vergonha da sexualidade que foi assumida e isso faz com que muitos peçam para que o filho não conte a ninguém. Para alguns pais, a vergonha é também uma forma de defesa, já que é comum ouvir nos noticiários relatos sobre violência e preconceito contra LGBT;
Religião: as crenças religiosas fazem com que os pais peçam aos filhos irem até a igreja em busca da "cura" e da "libertação" da condição. Embora muitas tratem a homo e bissexualidade, por exemplo, como escolha, ambas simplesmente acontecem;
Violência: tanto a verbal e quanto a física são muito comuns e as mais cruéis, principalmente, quando partem de um familiar. Já presenciei relatos angustiantes sobre xingamentos, expulsões de casa e jovens gays com marcas pelo corpo e face. Esse tipo de violência traz a angustia e evidencia o despreparo dos pais que não conseguem lidar sozinhos com suas frustrações;
Silêncio: sim, o silêncio. Quando você diz aos seus pais que é LGBT, nada é dito e eles mudam de assunto. E, muitas vezes, acaba ficando por isso mesmo e vocês nunca mais falaram sobre o que aconteceu. Acredito ser necessário um tempo para que eles possam refletir sobre você e esta nova informação, porém, a falta da fala pode distanciar pais e filhos de suas relações familiares e trazer prejuízos a longo prazo. Uma dica é: se isso acontecer, respeite, dê um tempo e após o tempo que você achar necessário, volte a conversar sobre. Muitos pais tem ideias irreais sobre filhos LGBT. Conversar sobre você e sua sexualidade e identidade de gênero pode fazer com que eles entendam que realmente nada mudou;
Convite ao psicólogo: muitos pais querem conversar antes com um psicólogo, a fim de pedirem que nós mudemos a cabeça de seus filhos. E ai, podem surgir novas decepções - já que esse não é o papel do psicólogo - e também, novos olhares com relação à diversidade de orientação sexual e identidade de gênero;
Mudança de ambiente: alguns pais forçam viagens. Na cabeça de muitos, é uma forma de se livrar do "problema". O pior é que esse afastamento só acarreta em mais consequências psicológicas para relação familiar;
Aceitação: falar para o filho que a sexualidade e identidade de gênero é dele e que ele pode vivenciá-la como bem entender, trazendo, é claro, uma certa responsabilidade para ele mesmo com relação a sua própria vida. Sabemos que essa reação vem de encontro com nossas expectativas, afinal, todos queremos ser aceitos, amados e bem vistos. E o melhor dos mundos é aquele que nossa família nos aceita como somos e nos apoia, independente do gênero com o qual nos identificamos ou por quem temos desejo sexual.
Se você sente necessidade de falar sobre sua sexualidade e identidade de gênero com sua família, pergunte-se antes: O que eu quero expor? Eles podem me entender? Que necessidade é essa que tenho?
Aos poucos as respostas vão surgindo dentro de você e no momento certo você saberá o que fazer. Na dificuldade, procure um psicólogo, possivelmente você será muito ajudado.
Márcio Iost é psicólogo, psicodramatista, Gestalt terapeuta, pós-graduando em terapia sexual, palestrante e atua em consultório. www.marcioiost.com.br